No dia em que eu vim-me embora
Caetano Veloso
No dia em que eu vim-me embora
Minha mãe chorava em ai
Minha irmã chorava em ui
E eu nem olhava pra trás
No dia que eu vim-me embora
Não teve nada de mais
Mala de couro forrada com pano forte brim cáqui
Minha vó já quase morta
Minha mãe até a porta
Minha irmã até a rua
E até o porto meu pai
O qual não disse palavra durante todo o caminho
E quando eu me vi sozinho
Vi que não entendia nada
Nem de pro que eu ia indo
Nem dos sonhos que eu sonhava
Senti apenas que a mala de couro que eu carregava
Embora estando forrada
Fedia, cheirava mal
Afora isto ia indo, atravessando, seguindo
Nem chorando nem sorrindo
Sozinho pra Capital
Nem chorando nem sorrindo
Sozinho pra Capital
Sozinho pra Capital
Sozinho pra Capital
Sozinho pra Capital…
Caetano Veloso & Gilberto Gil
(1968)
no dia em que parti para o brasil, pensava em não voltar. deixava para trás a minha família. vejo ainda o meu pai a arrastar a minha mãe pelo aeroporto fora, a minha mãe, que me olhava, virando a cabeça para trás, com um sorriso forte, a segundos de se transformar em choro. regressei a tempo de assistir ao definhar da minha avó, a tempo de presenciar o nascimento do diogo, o filho mais velho do meu irmão. não chorei quando me vim embora de portugal. mas choro sempre que ouço esta música, cantada pela elis regina. ela canta-a no feminino e, nesse momento, eu sou esta mulher com a mala de couro com pano forte brim cáqui. e volto a ser aquela rapariga que olhava a mãe arrastada pelo pai que não queria olhar para trás.